Brasil pode ser questionado na ONU pelos impactos e violações causados pela cadeia de mineração e de produção de ferro-gusa no interior do Maranhão

Sessão do Conselho de Direitos Humanos ocorrerá nesta sexta, em Genebra

Nesta sexta (25), o Brasil passará pelo segundo ciclo de revisões da situação dos direitos humanos no país, no contexto da Revisão Periódica Universal (RPU) do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Estarão reunidas em Genebra missões diplomáticas e organizações da sociedade civil de todo o mundo, além do alto comissariado da ONU, para apresentar relatórios e avaliar o atual estágio de cumprimento das obrigações internacionais assumidas por alguns dos países que compõem as Nações Unidas. A primeira participação do Brasil foi há quatro anos, quando o país recebeu quinze recomendações.

As violações de direitos causadas pela cadeia de mineração e de produção de ferro-gusa e a falta de controle socioambiental no eixo de Carajás pode ser um dos temas abordados na RPU. A Articulação Internacional dos Atingidos pela Vale, a ONG Justiça Global e a Rede Justiça nos Trilhos enviaram no fim do ano passado para o Conselho de Direitos Humanos da ONU um relatório de 15 páginas, com dados a respeito do tema.

O documento, cuja íntegra pode ser obtida aqui, aponta que as operações da Vale e das indústrias de ferro-gusa, bem como a incapacidade das autoridades públicas em monitorá-las, têm dado causa a diversas violações dos direitos humanos, como o direito à saúde e a um ambiente adequado, à moradia adequada, ao devido processo legal, entre outros. Por exemplo, a emissão de poluentes provenientes de usinas de ferro-gusa e de carvoarias - para o ar, água e solo – tem provocado doenças graves para as populações vizinhas, atacando em especial os olhos, as vias respiratórias e a pele.

Duas comunidades que foram particularmente afetadas pelas operações da Vale e das indústrias de ferro-gusa são o assentamento Califórnia e o povoado Piquiá de Baixo, ambas situadas no município de Açailândia, no interior do Maranhão.

No assentamento Califórnia moram 268 famílias que, a partir de 2005, foram obrigadas a conviver com a poluição advinda de 66 fornos de carvão vegetal, de propriedade da Vale. Hoje a área é cercada por grandes plantações de eucalipto. Em Piquiá de Baixo moram mais de 350 famílias que padecem dos impactos provocados por cinco indústrias de ferro-gusa e por instalações da Vale que operam ao longo da BR 222, próximas as casas da comunidade. Esses empreendimentos foram instalados a partir de 1987.

Também as violações de direitos que já estão ocorrendo sobre comunidades quilombolas, indígenas e de camponeses, em decorrência da duplicação da Estrada de Ferro Carajás, administrada em concessão pela Vale, fizeram parte do relatório e devem gerar quetionamentos aos representantes do Estado Brasileiro durante essa mesma sessão na ONU.

“No atual estágio do Direito Internacional, é legítimo a todo cidadão ou cidadã de um país que se considera lesado em seus direitos, remeter denúncias e buscar a intervenção de órgãos internacionais. Perante a comunidade internacional, o Estado brasileiro é o responsável pelo que acontece dentro de seu território e, se algo não vai bem, pode e deve ser cobrado e responsabilizado pelo descumprimento das normas internacionais que ele mesmo se dispõs a cumprir”, diz Andressa Caldas, diretora da ONG Justiça Global.

Danilo Chammas, advogado e membro da Rede Justiça nos Trilhos, outra das organizações que enviou o documento para a ONU no fim do ano passado, acrescenta que “infelizmente, a demora das autoridades brasileiras em reparar os danos já sofridos e em impedir que as violações sigam se repetindo nos fez chegar a esse ponto de voltar a denunciar essas violações internacionalmente. Esperamos que a partir de agora, a partir das recomendações que virão da ONU, as autoridades brasileiras ajam com maior vigor na defesa dos direitos das comunidades de Piquiá de Baixo, do Assentamento California e de todas as outras igualmente impactadas pelas atividades de mineração e de produção de ferro-gusa no Maranhão e em todo o país.”  

Sobre a Revisão Periódica Universal
A RPU é um mecanismo do Conselho de Direitos Humanos da ONU para monitorar regularmente o cumprimento, por parte de cada um dos 193 Estados-Membros da ONU, das suas obrigações e compromissos sobre os direitos humanos. Trata-se de um processo de revisão entre Estados, a que todos os Estados-Membros das Nações Unidas são submetidos a cada quatro anos e meio, com o objetivo de melhorar a situação dos direitos humanos nos países.

Uma parte importante desta revisão é o encontro de três horas e meia no Grupo de Trabalho sobre a RPU entre o Estado, observadores e os Estados-Membros participantes. Durante este debate, os Estados-Membros podem fazer perguntas e recomendações ao Estado em revisão. O resultado da revisão será um relatório que contém um resumo do processo de revisão, as conclusões e/ou recomendações, além dos compromissos voluntários assumidos pelo Estado em questão. 


Rede Justiça nos Trilhos
Justiça Global

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