Quatro
trabalhadores morreram em siderúrgicas maranhenses desde 2010. Sindicato
contabiliza 177 acidentes de trabalho nos últimos dois anos
Em
25 de outubro, o soldador Kennys de Oliveira Silva, de 21 anos, tornou-se a
mais recente vítima fatal em acidentes nas siderúrgicas do Polo Carajás, que
congrega as fábricas de ferro gusa e aço instaladas no Maranhão e no Pará. Ele
trabalhava há apenas dois meses nas obras de expansão do grupo Ferroeste em Açailândia
(MA). Dono de uma das maiores indústrias de ferro gusa da região – a Gusa
Nordeste –, o grupo está construindo aquela que deve ser a primeira aciaria a
funcionar em território maranhense.
Kennys de Oliveira Silva, soldador morto trabalhando obras de expansão do grupo Ferroeste em Açailândia (MA). Foto: Divulgação/Justiça nos Trilhos
Uma
descarga elétrica teria sido a causa do óbito, segundo informações fornecidas à
família pelo Instituto Médico Legal (IML). A mãe do jovem, Iorlete Ferreira de
Oliveira, aguarda um posicionamento da empresa sobre as circunstâncias do
ocorrido. “O que me foi dito é que o resultado da perícia sairia, no máximo, em
30 dias”, informa.
O
Sindicato dos Metalúrgicos de Açailândia e Região (STIMA) informa esta foi a
quarta morte ocorrida em siderúrgicas maranhenses desde 2010. Numa avaliação
preliminar, baseada em conversas com funcionários da Ferroeste, Jarlis Adelino,
o presidente da entidade, acredita que o falecimento de Kennys Silva possa ser
creditado a “uma fatalidade”. Em relação aos outros três óbitos, no entanto,
ele vê a influência de falhas de segurança e problemas na organização do ambiente
de trabalho. São casos que remetem, de acordo com o representante sindical, a
um funcionário esmagado, a outro que foi atropelado por um caminhão, e ainda um
terceiro que caiu de um telhado.
“Desconhecemos
qualquer perícia oficial que tenha sido realizada devido às mortes”, coloca
Adelino. Segundo ele, existem apenas as perícias feitas pelas próprias
empresas. “Acredito que, para serem mais transparentes, elas deveriam ao menos
contar com o acompanhamento do sindicato, mas isso não acontece.” O STIMA afirma
ainda ser insuficiente, nas siderúrgicas locais, o número de pessoas empregadas
em determinadas funções, fato que sobrecarrega funcionários e,
consequentemente, traz riscos à segurança. A crise internacional, iniciada em
2008, provocou demissões significativas nas guseiras do Polo Carajás.
Atualmente,
a indústria de ferro gusa maranhense emprega cerca de três mil pessoas. De
acordo com o sindicato, o setor comunicou à Previdência Social, entre 2011 e
2012, a ocorrência de 177 acidentes de trabalho. Queimaduras e problemas de
coluna estariam entre os principais problemas vivenciados pelos trabalhadores
no cotidiano laboral do setor.
Estatísticas oficiais
Os dados mais recentes do Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho, publicado pela Previdência Social, apontam, entre 2008 e 2010, a produção de ferro gusa entre os 20 segmentos econômicos que tiveram maior incidência de acidentes de trabalho, doenças ocupacionais e incapacidade temporária de trabalhadores no Maranhão (em proporção ao número de empregos mantidos por cada setor). O Anuário leva em conta mais de 250 atividades econômicas desenvolvidas no estado.
Os dados mais recentes do Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho, publicado pela Previdência Social, apontam, entre 2008 e 2010, a produção de ferro gusa entre os 20 segmentos econômicos que tiveram maior incidência de acidentes de trabalho, doenças ocupacionais e incapacidade temporária de trabalhadores no Maranhão (em proporção ao número de empregos mantidos por cada setor). O Anuário leva em conta mais de 250 atividades econômicas desenvolvidas no estado.
Para
Bruno Milanez, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, o cenário na
produção de ferro gusa é particularmente preocupante em comparação com outros
segmentos da siderurgia. “Na questão da saúde e segurança do trabalhador, houve
um avanço muito maior nas siderúrgicas integradas do eixo Sul-Sudeste do que
nas guseiras”, pondera. Entre 2002 e 2006, um artigo publicado por Milanez e
pelo o pesquisador Marcelo Firpo de Souza Porto indentificou um sistemático
aumento de acidentes no setor, em contraste com tendência de queda em
outros segmentos da siderurgia. Os estados do Pará e do Maranhão concentravam,
na ocasião, os maiores índices de acidentes.
Mapa
do pólo siderúrgico de Carajás, um dos principais no Brasil. Fonte:"Combate à devastação ambiental e ao trabalho
escravo na produção do ferro e do aço"
A
exposição dos trabalhadores à poluição atmosférica é outra preocupação
levantada pelo padre Dário Bossi, um dos coordenadores da rede Justiça nos
Trilhos. Segundo ele, faltam pesquisas sobre os efeitos da fuligem e da fumaça
na saúde dos funcionários das siderúrgicas maranhenses. “Eles estão no ponto
zero das emissões, então é uma situação preocupante”, ressalta. Em Açailândia,
a poluição do ar oriunda do polo guseiro motiva inclusive ações do poder
público para o reassentamento de moradores instalados em áreas vizinhas às
fábricas.
Outro lado
Procurado pela Repórter Brasil, o grupo Ferroeste respondeu através de seu diretor e acionista, Ricardo Nascimento. Ele informa que a recente morte de Kennys Silva foi objeto de perícia, cujo resultado ainda não estava disponível até o fechamento dessa reportagem. Mas Nascimento adianta que o trabalhador recebeu todos os treinamentos cabíveis, dispunha dos equipamentos de segurança necessários e que toda a assistência possível foi dada à família. “Não houve imprudência da empresa. Foi um acidente, como pode acontecer em qualquer obra do Brasil”, coloca.
A
reportagem também procurou o Sindicato da Indústria de Ferro Gusa do Estado do
Maranhão (Sifema) para comentar questões sobre saúde e segurança do trabalhador.
A entidade afirma que não há sobrecarga de função nas siderúrgicas. “Sobre o
número de funcionários na linha de frente de produção, este é compatível com a
capacidade de produção determinada em cada empresa”, atesta a entidade, por
meio de nota. O Sifema também discorda da existência de dificuldades de acesso
do sindicato dos trabalhadores às companhias do setor, “visto que, tanto o
sindicato patronal, quanto suas filiadas, sempre mantiveram diálogo aberto com
os trabalhadores e seus representantes, e sempre se mostraram disponíveis para
prestação de informações solicitadas formalmente”.
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