Como uma
doutrina religiosa é capaz de criar empresários e executivos de sucesso.
Eles não bebem, não fumam, não usam
drogas nem tomam café. Andam invariavelmente com camisas de manga curta e
gravata. Os cabelos são impecavelmente penteados. Trabalham duro, muito duro. E
estudam nas melhores universidades. A família é o que há de mais importante em
suas vidas. Essa é a descrição dos seguidores da Igreja de Jesus Cristo dos
Santos dos Últimos Dias, mais conhecidos como mórmons. Criada no início do
século 19 nos Estados Unidos, a religião espalhou-se por praticamente o mundo
todo, inclusive no Brasil – onde tem 200 mil seguidores. O seu vasto império
comercial é avaliado em US$ 40 bilhões.
Dona de diversos negócios com fins
lucrativos, organizados sob a holding DMC, com sede em Salt Lake City, no
Estado de Utah, a empresa conta com seis subsidiárias, que controlam 11
estações de rádio, uma emissora de tevê, diversas empresas de mídia impressa e
digital, além de uma prestadora de serviço de hospitalidade e uma seguradora,
com mais de US$ 3,3 bilhões em ativos. Neste ano, inaugurou um shopping que
custou US$ 2 bilhões em sua terra natal, onde está localizado o maior templo da
Igreja, com capacidade para sete mil fiéis. É fácil entender por que os mórmons
têm tantas posses. Eles podem ser considerados a
mais capitalista das religiões – embora outras, como a calvinista, abençoem o
lucro e estimulem seus seguidores a enriquecer, ela difere na forma como está
organizada, semelhante à de uma corporação.
Seus dogmas seguem conceitos que são
muito apreciados no mundo dos negócios. Por essas razões, boa parte de seus
fiéis são empreendedores de sucesso ou executivos bem-sucedidos em grandes
empresas. No Brasil, pode-se citar o empresário paulista Carlos Martins,
presidente do grupo Multi, dono de várias escolas de idioma e de informática,
como a Wisard e S.O.S Computadores, cuja receita ultrapassa os R$ 3 bilhões. O
brasileiro David Neeleman, que criou a companhia aérea Azul, atualmente dona de
uma fatia de 10% do mercado de aviação civil nacional, é outro mórmon de
destaque. Ele nasceu no Brasil, quando seu pai cumpria uma missão no País. Mais
tarde, ele próprio foi missionário no Rio de Janeiro e no Nordeste.
A lista inclui o gaúcho Francisco
Valim, que tem o desafio de fazer a empresa de telefonia Oi crescer novamente.
“Desde pequenos aprendemos a liderar e a lidar com a rejeição”, afirma Martins,
referindo-se ao fato de pertencer a uma confissão minoritária. “Isso ajuda
muito na hora de enfrentar o mercado de trabalho.” Nos Estados Unidos,
destacam-se o candidato republicano à Presidência Mitt Romney, fundador da Bain
Capital, empresa de private equity com uma carteira de investimentos superior a
US$ 60 bilhões. Outro bilionário mórmon é Jon Huntsman, filho do fundador da
Huntsman Corporation, gigante da indústria química, com valor de US$ 11 bilhões
na bolsa de Nova York.
Quem também contribui com 10% de seus
rendimentos à igreja é J.W. Marriot, presidente da cadeia de hotéis Marriot.
Assim como para os católicos um dogma importante é acreditar na Santíssima
Trindade, os mórmons são doutrinados pelo trabalho. Para seus devotos,
trabalhar é uma obrigação espiritual, como ir à missa aos domingos e rezar o
Pai Nosso é para os súditos do papa Bento XVI. O sucesso nos negócios,
portanto, nada mais é do que um sinal de que o indivíduo está seguindo os
mandamentos da Igreja. “Uma coisa que aprendemos é ser perseverantes”, afirma o
mórmon Paulo Kretly, presidente da consultoria americana de treinamento
FranklinCovey, no Brasil. “Dessa maneira, conseguimos o sucesso que algumas
pessoas não alcançam por falta de paciência.”
Nascido em uma família humilde — seu
pai não chegou a completar o segundo grau —, Kretly precisou conciliar a
carreira com os estudos e o trabalho voluntário na Igreja. Mesmo com as
dificuldades, completou o mestrado e iniciou um doutorado. Essa firmeza e essa
obstinação de objetivos são injetadas desde muito cedo aos fiéis. Aos 8 anos,
eles são incentivados a fazer pequenos discursos nas igrejas, para perderem o
medo de falar em público. Aos 19 anos, recebem um “choque de gestão” ao se
alistarem nas missões. Voluntariamente, eles abandonam o convívio familiar e
são encarregados da evangelização e conquista de novos adeptos, na maioria das
vezes no Exterior. Antes de embarcarem, os missionários passam por um centro de
treinamento, no qual aprendem a “vender” a religião.
Durante a missão, que dura dois anos,
podem entrar em contato com a família apenas duas vezes. “É uma experiência
muito difícil, uma vez que temos de sair de casa para enfrentar o
desconhecido”, afirma o mórmon Paulo Amorim, ex-sócio da Korn Ferry e atual presidente
da Alexander Proudfoot, consultoria especializada em produtividade, na América
Latina. “Quando voltamos, no entanto, somos capazes de vender qualquer coisa.”
Com passagem pela Autolatina, fusão da Volkswagen com a Ford, no Brasil, nos
anos 1980, e pela americana Pepsico, Amorim se especializou em trabalhar na
formatação de grandes transações. Um exemplo em que esteve envolvido foi na
consolidação das operações das Pizza Hut e KFC no Brasil.
Jargões corporativos, como
“coaching”, e palavras como liderança e conselho consultivo são também comuns
para explicar o funcionamento da Igreja Mórmon. “A organização da Igreja é
perfeita”, afirma Martins, do grupo Multi. “Qualquer empresa que adotá-la será
bem-sucedida.” Foi o que fez Martins, quando começou, em 1987, a dar aulas
particulares de inglês em Curitiba. Ele usou o método de ensino mórmon para
aprender idiomas, que promete que qualquer um pode falar outra língua
rapidamente. Tanto que, na ocasião, o empresário adotava o slogan “Inglês em 24
horas” como chamariz para atrair clientes. Um quarto de século depois, Martins
é dono da maior rede de ensino de idiomas do País, que conta com 700 mil
alunos. Tudo construído na base dos preceitos mórmons, com persistência e muito
trabalho duro.
Por Rodrigo CAETANO
Fonte:
http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/93097_O+JEITO+MORMON+DE+FAZER+NEGOCIOS
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